domingo, 19 de fevereiro de 2012

 OS TELEFONEMAS

Você chega em casa do trabalho e encontra um monte de recados na secretária eletrônica. Como conhece bem a vida e é observadora, nem precisa ligar para saber do que se trata: as pessoas não mudam.

Tem a que quando telefona é sempre para pedir alguma coisa. Uma informação, um vestido emprestado, o endereço de uma costureira a quem você se referiu 30 anos atrás, o que for, mas sempre, sempre um pedido, ou melhor: um aluguel. Quando você ouve a voz na máquina já sabe – e se não ligar de volta, está mais do que perdoada. Deveria, pelo menos.

A outra só liga para contar problemas: da empregada que não veio trabalhar na segunda-feira à filha que foi estudar na Europa e não sá sinal de vida, a não ser para pedir dinheiro; passa por todos, até chegar ao principal: o sentimental.

É preciso ter tempo sobrando para ouvir, sem gritar: “você acha que quando ele me largou na festa sozinha e saiu com aquela piranha era o quê? insegurança?” E você, responde o quê? para ter paz, o que ela quer ouvir, isto é: “insegurança infantil, claro. Ele é louco por você mas tem medo, porque você é uma mulher muito forte”. Pronto: ela fica feliz, e você ainda tem tempo de ver aquele filme na televisão.

Tem também a outra que só chama para te agredir, com tantas felicidades. Na vida dela tudo está dando certo: o homem é maravilhoso, os filhos são divinos, ganhou uma ilha em Angra, vai passar o Natal no Egito cara a cara com uma pirâmide; enquanto ela fala estraçalha uma caixa de chocolates, e ainda diz que pode comer o que quiser que não engorda, a idiota. Para conseguir desligar rápido, um método infalível: pedir dez mil dólares emprestados, já que ela está tão bem de vida. O papo acaba na hora.

E tem a da psicanálise, que conta a sessão que teve no analista, entrando nos detalhes mais íntimos da infância dos pais e dos avós, o que explica por que seus relacionamentos nunca dão certo. Essa é das boas, e só fingindo que a linha caiu. Nesse caso, por precaução, deixe o fone fora do gancho até a manhã seguinte.

A outra é a encarnação da bondade e, como não quer incomodar, deixa recados enormes dizendo que o motorista vai levar um prato de docinho que só a empregada dela sabe fazer, aqueles que você adora tanto. Como nasceu para servir, já adianta: sabe que você é muito ocupada, por isso nem se incomode de telefonar para agradecer. Para ela, saber que você ficou feliz já a faz feliz. De matar, essa.

Raras são as que telefonam só para dizer que viram um filme que acham que é a sua cara e aí sentiram saudades; com essas a conversa rola legal – você conta suas coisas, elas contam as delas, se despedem com afeto, prazer, e sobretudo sem aquele “precisamos nos ver – quando é que a gente vai almoçar?” Esse almoço dificilmente vai acontecer – e as duas sabem disso.
E tem aquela que liga e quando ouve a mensagem desliga. Você sabe perfeitamente quem é, e sabe que ela vai ligar de novo até você atender – você -, e não a máquina.

Por que as pessoas são sempre iguais?

Texto de Danuza Leão